Seguidores ruins
El Estadão / Moisés Naím e tradução de Renato Prelorentzou
O mundo passa por um problema de líderes. Há muitos ladrões, incompetentes ou irresponsáveis. Alguns malucos. Muitos combinam todas essas falhas. No entanto, também temos um problema de seguidores. Em todo lugar, as democracias se veem abaladas por votos de cidadãos indolentes, desinformados ou de ingenuidade superada apenas por sua irresponsabilidade.
São os britânicos que, depois de terem votado a favor do rompimento com a Europa, foram aos milhares pesquisar no Google o que significava aquele negócio de Brexit. Ou os americanos que votaram em Donald Trump e agora estão descobrindo que ele os fará perder a assistência médica. Ou aqueles que acreditaram quando ele prometeu que não iria governar com as elites corruptas de sempre e agora veem lobistas que representam vorazes interesses privados ocupando cargos importantes na Casa Branca. São cidadãos que não perdem tempo votando porque “todos os políticos são iguais” ou porque acham que seu voto não vai mudar nada. Com certeza você conhece alguém assim.
Claro que devemos nos esforçar para procurar líderes melhores. Mas também é preciso melhorar a qualidade dos seguidores. Sempre existiram cidadãos mal informados ou politicamente apáticos – além daqueles que não sabem em quem (ou contra quem) estão votando. Mas agora as coisas mudaram e os votos dos indolentes, desinformados e confusos ameaçam a todos nós.
A internet deixa mais fácil o trabalho de demagogos, representantes de interesses obscuros e ditadores que querem manipular eleitores desinteressados ou distraídos. A rede não é só uma fonte de informação: também se transformou em um tóxico canal de distribuição de mentiras.
Na internet, somos todos vulneráveis, principalmente aqueles que, por estarem sempre ocupados ou por apatia, não fazem maiores esforços para verificar se é verdade o que dizem as sedutoras mensagens políticas que chegam pelas redes.
Mas não são apenas os apáticos. No polo oposto estão os ativistas, cujas posições intransigentes deixam a política mais rígida. Quem tem muita certeza nas próprias ideias encontra na rede abrigos digitais onde pode interagir somente com pessoas que compartilham de seus preconceitos e onde circulam apenas as informações que reforçam suas crenças.
Além disso, redes sociais como Twitter e Instagram obrigam a usar mensagens breves. A brevidade propicia o extremismo, uma vez que, quanto mais curta a mensagem, mais radical deve ser para circular. Nas redes sociais não há espaço ou paciência para ambivalências ou nuances entre visões divergentes. Tudo é muito branco ou muito preto. Naturalmente, isso favorece os sectários e dificulta os acordos. Que fazer? Para começar, quatro coisas:
Primeiro, uma campanha que nos deixe menos vulneráveis às manipulações pela internet. É impossível alcançar imunidade completa contra ciberataques que usam mentiras, tentam influenciar nosso voto ou nossas ideias. Isso não significa que o desamparo é total. Há muito que pode ser feito e divulgar as melhores práticas de defesa contra a manipulação digital é um primeiro passo indispensável.
Segundo: é inútil oferecer as melhores práticas para quem não está interessado em usá-las. É indispensável uma campanha contínua para explicar as consequências da preguiça eleitoral.
Terceiro: há que se dificultar a vida dos manipuladores. Aqueles que orquestram campanhas de desinformação devem ser punidos. Os manipuladores florescem na opacidade e se beneficiam do anonimato. Portanto, os interesses por trás das informações que consumimos devem ser mais transparentes. É necessário reduzir a impunidade com a qual operam os que minam nossas democracias.
Quarto: impedir que as empresas de tecnologia da informação e de redes sociais atuem como facilitadoras para manipuladores. A interferência estrangeira nas eleições americanas não teria sido possível sem Google, Facebook e Twitter. Hoje, sabemos que as três empresas lucraram vendendo anúncios eleitoral pagos por clientes associados a operadores russos.
Essas empresas devem ser obrigadas a usar seu poder tecnológico e de mercado para proteger os consumidores. E é preciso que lhes seja mais custoso servir de plataforma para o lançamento de agressões antidemocráticas. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU